Morrer para renascer - Nun, o 24º Caminho - Kabbalah Hermética


Letra Nun em hebraico 



Título: O ventre redentor

Inteligência: Inteligência Imaginativa

Localização: Entre Tiferet e Netzach

Significado: Peixe

Valor Gemátrico: 50

Anjo: Barbiel

Qliphot: Niantiel

Cor: Verde-Azulado

Incenso: Benjoim

Animais: Escaravelho, escorpião

Seres Lendários: bruxa megera (hags)

Pedras: -

Plantas: Cacto, mandrágora

Árvores: Teixo

Correlação: Escorpião (signo)

Tarot: A Morte

Poderes: Necromancia, mediunidade

Símbolos:  Foice

Rituais: projeções astrais, transformações

 

 

O Caminho de Nun



Nun é o 24º Caminho da Árvore da Vida, localizado entre as esferas de Tiferet e Netzach, e é um dos três caminhos que conectam a Personalidade ao Eu Superior, sendo os outros dois os Caminhos de Ayin e Samekh.

O Eu Superior (Tiferet) manifesta sua luz divina até Netzach, e essa esfera, por sua vez, gera as Emoções Inspiradoras que emanam para a Personalidade. Portanto, encontramos em Netzach a base das emoções e instintos que possuímos, assim como sua natureza passional, e também a força de nossas inspirações, provenientes de Tiferet, que traz consigo toda a beleza da centelha divina que temos e dos potenciais que podemos alcançar.

O Caminho de Nun é conhecido como o famoso Caminho da Morte. Isso se dá pela sua associação ao tarot com o Arcano A Morte, assim como a ideia de redenção ou sacrifício, quando se sobe a Árvore da Vida de Netzach a Tiferet.


 Morrer é nascer de novo

 

Morrer é uma transição, e essa é uma visão espiritual no qual diz que a morte não é um fim, mas sim uma passagem para outro lugar, outro Plano, outra consciência. Passamos por diversos processos da morte do Eu em nossas vidas, e assim, tornamo-nos quem somos hoje. Esse processo pode ser chamado também de transformação.

O apego à matéria, às emoções, aos sentimentos, ao passado, prende-nos numa forma incapaz de realizar mudanças em quem somos. A incapacidade de mudar tem como consequência ver-se preso sempre às mesmas coisas, às mesmas situações. É ser incapaz de aproveitar as novas oportunidades que a vida dá para crescer, para mudar, de alcançar novos patamares de consciência.

Se a ideia da existência dessa nossa atual encarnação, dentro do que a Árvore da Vida nos apresenta, é entender a beleza que é Tiferet e sê-la nesse mundo através de nosso ser, então a transformação causada pela morte é o meio para esse fim.

 

 

A Morte no tarot de Thoth



No tarot, A Morte é um chamado para transformação. É finalizar, deixar para trás, fechar um ciclo. Um fim que clama por acontecer para que haja renovação e renascimento. Paul Foster Case diz que:

 

O homem teme a morte porque não conhece o significado desta transformação. "Dissolução é o segredo da Grande Obra." A dissolução da forma é imperativa para o crescimento. Quando as formas se quebram, a energia é liberada e é utilizada para um maior desenvolvimento.” [1]

 

 

Redenção e Sacrifício 

No 24 º Caminho, tem-se o entendimento que os desejos que constituem a Personalidade são temporários e ilusórios, muitos deles mundanos. Na busca de reintegração com o Eu Superior, busca-se a renúncia dos desejos que nos afastam dele. Logo, temos uma morte voluntária, um sacrifício que tem por finalidade o encontro com nosso Eu Superior, Tiferet, e assim termos nossa redenção. Renascemos agora para uma nova vida.

“Redenção é o ato ou efeito de redimir ou remir, que significa libertação, reabilitação, reparo, salvação. É o ato de adquirir de novo, de resgatar, de tirar do poder alheio, do cativeiro. É livrar-se de um passo arriscado, é livrar-se das penas do inferno.” [2]

É em Nun que podemos exercer o nosso Ofício Sagrado, o Sacro Ofício – Sacrifício. Realizar as belezas que emanam de Tiferet é um trabalho sagrado, e para isso é preciso abrir mão daquilo que nos afasta dele. Muitas vezes, o que nos afasta de buscar realizar o que nossa Essência clama por fazer é estarmos presos a desejos do ego. Desejos que visam apenas a satisfação pessoal, sem um fim maior benéfico aos outros. Ir pelo caminho de Nun é saber que a natureza passional egoica da Personalidade será sacrificada em prol de algo maior.


Jesus na cruz é um exemplo de sacrifício por um bem maior



Mas a ideia de sacrifício não deve ser vista como algo ruim. Ela não é a perda de algo voluntário e querido, mas sim a entrega de uma força que se transformará em outra, e por estarmos aqui em Nun em conexão com Tiferet, essa força será uma expressão da beleza e da luz divina.


Pilar da Misericórdia e o Caminho da Mão Direita


 


No Pilar da Misericórdia, à direita no diagrama da Árvore da Vida, tem-se as esferas de Hochma (Sabedoria), Chesed (Misericórdia) e Netzach (Vitória), e ele traduz a essência do Caminho da Mão Direita, sendo esse um termo para designar correntes religiosas ou espirituais que trabalham visando o bem do outro. É um caminho de solidariedade, caridade, benevolência, altruísmo, no qual o egoísmo é sacrificado em prol de algo maior e da prática do bem.

Quando o indivíduo entende que seu propósito é maior que a si mesmo, é nesse momento que ocorre uma união com algo que poderíamos caracterizar como divino. E nessa união há o fim do eu individual, do ego, e assim, sua vontade é una com a vontade divina.

 

Outono e o signo de Escorpião


 


No hemisfério norte, a entrada do signo astrológico de Escorpião corresponde à estação do outono. É nessa estação que a natureza está aos poucos morrendo, para que então renasça na primavera. O signo de escorpião, rasamente falando, está ligado à temática de transformação, regeneração, morte e renascimento. Portanto, tanto o signo quanto a estação correspondem ao Caminho de Nun.

Glifo do signo de Escorpião


 Tomando como referência mais uma vez o hemisfério norte, existe a comemoração do Sabbat de Samhain, que ocorre na mesma época de festividades que celebram ou relembram a morte, como o Halloween ou então o Dia de los Muertos, no México, que ocorrem enquanto se passa o outono.

 

Khepri: o escaravelho que também é um deus solar

 

Khepri, que significa escaravelho, era uma das formas de retratar o deus sol, que algumas vezes era representado por um homem com um escaravelho no lugar da cabeça, ou apenas pelo escaravelho carregando um disco solar.


Esse tipo de escaravelho, o escaravelho-sagrado (Scarabaeus sacer), conhecido aqui como besouro rola-bostas, são os únicos insetos do tipo com capacidade de orientação, os primeiros a se guiarem usando a Via Lactea [3]. Eles se alimentam de fezes de outros animais, para isso vão rolando um pedaço entre suas pernas até formar uma bola, que é posteriormente enterrada para servir como alimento.

Esses besouros percorrem esse caminho, guiando-se da direção leste para oeste, seguindo o mesmo percurso do sol desde o nascer até o pôr. Por esse motivo, eles são considerados uma das representações do deus-sol, pois os antigos egípcios associavam seu movimento ao movimento do sol, que eles enxergavam como uma "bola" que atravessava os céus de leste a oeste.

Nas bolas de esterco, os besouros depositam suas larvas, das quais novos besouros irão nascer. Para os egípcios, eles pareciam nascer do nada, autoconcebidos, assim como o deus-sol, que possuía essa característica.

E também, quando morriam e suas larvas fecundadas não eram depositadas, mas permaneciam em seus corpos, ocorria um fenômeno "divino”: “[...] do ovo que fecundou sai outro escaravelho, como a alma se escapa da múmia e sobe para o céu. Assim, o inseto era, para os egípcios, o símbolo da vida que se renova eternamente a partir de si mesma.” [4]

Daí vem sua associação com o 24º Caminho da Árvore da Vida.



O significado de Peixe em Nun

 

A palavra Nun significa peixe, o que para o 24º Caminho, dentro da Kabbalah Hermética, tem uma associação especial.

Nun, como dito anteriormente, está relacionada aos caminhos espirituais de Mão Direita, que visam amor, caridade e sacrifício em prol de um bem maior ou da humanidade. Uma das religiões que mais carregam essas características é o Cristianismo.

O Cristianismo tem como símbolo um peixe, que parece ter suas raízes lá no Cristianismo Primitivo como símbolo para o Messias Yeshua. Em grego, a palavra para peixe é "ixthus" [5]. Há uma crença de que essa palavra foi usada como um acrônimo para a frase grega:

Iesous Xhristos Theou Uios Soter  - Jesus Cristo, o Filho de Deus Salvador

 


“O peixe é também um símbolo da renovação e manutenção da vida, e a renovação e transformação das energias de vida e de morte em um constante movimente de fluxo e refluxo cósmico e microcósmico” - A Cabala Draconiana, Adriano Camargo.

 

- Vesica Piscis


Vesica Piscis, que quer dizer bexiga de peixe, é uma figura geométrica da interseção de dois círculos com o mesmo raio, de forma que o centro de cada um está no perímetro do outra. Ela forma a flor da vida, significando o movimento do UM, dando origem à criação.



Ela simboliza o ventre da “Mãe Cósmica”, o ovo da vida, o fruto da vida, a flor da vida [6]. O Liber 777 faz uma única referência ao título de Nun dizendo que é o Ventre Redentor, atribuindo-o ao Arcano XIII, A Morte. Mas ao considerar o simbolismo apresentado pela figura da Vesica Piscis como um ventre, é notável perceber que dele vem a vida, e a vida, por sua vez, implica na morte, constituindo um eterno ciclo.

Podemos renascer várias vezes numa mesma vida com o intuito de nos tornar um novo eu. Melhor, mais forte, mais apto à existência que vivemos, e até mesmo buscando uma redenção. O título de Ventre Redentor fica mais fácil de entender visto dessa maneira.

A figura central formada na Vesica Piscis é chamada de “mandorla”, da qual também forma o símbolo do peixe no cristianismo. No entanto, a Vesica Piscis é um símbolo muito mais antigo que essa religião.

No Templo de Osíris, no Egito, foi encontrado esse símbolo em uma expedição arqueológica feita pelos arqueólogos Flinders Petrie e Margaret Murray [7].

Osíris, o deus que morreu e renasceu, era originalmente o deus da fertilidade e agricultura, mas depois de seu assassinato pelo deus Set, e trazido de volta à vida por Isis, virou o deus ligado aos ritos fúnebres. Anúbis encarrega ele de fazer o julgamento dos mortos, pesando o coração deles na balança.


Por ser um deus ligado à agricultura e juiz dos mortos, ele está relacionado aos processos de morte e renascimento da vida.  

 

Outras correspondências atribuídas a Nun

 

- Putrefação na alquimia


 

Nun pode ser relacionado ao processo de putrefação na alquimia, que ocorre nas trevas inferiores do ser. É a noite escura da alma de São João Baptista. Tendo como intuito dar lugar a uma nova vida num novo nível evolutivo.

A putrefação é um processo doloroso, pois é preciso abandonar, fazer o sacro ofício, e pra isso é preciso uma entrega. Do que? De você! E esse processo gera transformação, através de uma morte simbólica que resultará em algo novo.

“Toda fase dolorosa da qual é preciso se libertar, todo desprendimento de coisas supérfluas, toda destruição de ilusão, todo aprendizado e evolução em novos caminhos, são impulsionados pelas forças de Nun, ou da Morte”A Cabala Draconiana, Adriana Camargo

 

- Qlipha

 

Niantiel é a Qlipha desse Caminho. Quando o indivíduo se agarra ao ego, à juventude, tem medo de envelhecer, é insatisfeito com o que se é em essência, ao natural. Ele prende-se às transformações levadas pela luxúria e estética para manter-se jovem ou num ideal de perfeição que o mundo impõe, ignorando a real perfeição da beleza existente em Tiferet e na essência que dela emana. A transformação que o tempo traz causa repulsa.

Dessa maneira, é preciso cuidado para não cair nesse túnel, pois várias vezes na vida iremos encarar as transformações do Caminho de Nun.

 

- Inteligência Imaginativa

 

“O 24º Caminho é o da INTELIGÊNCIA IMAGINATIVA, assim chamado porque dá uma semelhança a todas as semelhanças que são criadas, de um modo semelhante para suas próprias elegâncias harmoniosas.”

Para entender essa atribuição da Inteligência Imaginativa, é mais fácil pensar no axioma hermético “o que está em cima é como o que está embaixo”.  A Personalidade busca a perfeição do Eu Superior, Tiferet, e busca tornar-se o reflexo dele. Torna-se semelhante desse jeito.

 

- Demais atribuições

 

Hags, que pode ser traduzida como bruxa, significando uma velha anciã perita em magia, seria uma espécie de fada idosa ou mesmo uma divindade selvagem. Seu mito diz que essas bruxas possuem um aspecto assustador, muito poder, e se alimentam de carne, até mesmo humana, isso seria uma metáfora para a capacidade de transformar a vida das pessoas. Simbolicamente ele come ou mata os seres humanos para que renasçam para uma nova vida. [8]

A foice é um instrumento do deus Saturno/Cronos, deus do tempo, vida e morte.

Quase todas atribuições restantes estão presentes no Liber 777 fazendo correlação ao signo de Escorpião, algumas sem muita explicação ou fontes que expliquem o motivo.

 

Nada morre, tudo se transforma

 

No Caminho de Nun, é possível ver a importância da morte simbólica na vida pessoal. Ela traz regeneração, traz cura, traz um novo jeito de ver e agir no mundo. Emerge assim um novo Eu desse processo, que no fim é uma busca consciente de transformação de quem somos, em prol de sermos o melhor de nós, de exercermos nossa Grande Obra, de ajudar o próximo.

Nun torna-se um dos portais de acesso à beleza de Tiferet, que é possível acessar através desses eternos processos de lapidação de quem somos. A Personalidade egoica, mundana, transforma-se aos poucos na expressão do Eu Superior, afinal, nada morre, tudo se transforma.

 

 

Referências bibliográficas:

A Cabala Draconiana – Adriano Camargo

Kabbalah Hermética – Marcelo Del Debbio

Liber 777 – Aleister Crowley

O Tarot Cabalístico – Robert Wang

Tarot Cards Meanings Fundamentals [1] - Paul Foster Case

Redenção [2]. Disponível em: https://www.significados.com.br/redencao

Escaravelhos batalham por uma bola de esterco [3]. Disponível em: https://www.nationalgeographicbrasil.com/video/tv/escaravelhos-batalham-por-uma-bola-de-esterco

O Escaravelho Sagrado [4]. Disponível em: https://www.fascinioegito.sh06.com/escarave.htm

A Letra Nun [5]. Disponível em: https://pontodevistacristao.weebly.com/a-letra-nun.html

Vesica Piscis [6] [7]. Disponível em: https://www.eagrandemaeviroudeuspai.com/post/vesica-piscis

Hag [8]. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hag

A Alquimia como processo transformador. Disponível em:   https://www.jungnapratica.com.br/a-alquimia-como-processo-transformador/

Caminho da Mão Direita. Disponível em: https://ebrael.wordpress.com/2020/01/23/caminho-da-mao-direita/

Osíris. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/osiris/

Processo Alquímico – Montanha dos Adeptos. Disponível em:  https://psicoterapiajunguiana.com/conceitos/processo-de-individuacao/processo-alquimico-montanha-dos-adeptos/

Imagem da Árvore da Vida e do Caminho de Nun autoria de Hod Studio


 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O Blog

Este blog aborda temas sobre diversas áreas do Hermetismo, e mostra como encontramos nele uma poderosa ferramenta de desenvolvimento pessoal, de reencontro com nosso Eu Interior, com a natureza, e com a espiritualidade. Levando-nos assim rumo à Tiferet.

Procure aqui

Redes Sociais

Mais vistos da última semana

Curta a página